Previsão é que júri se encerre nesta quinta-feira com leitura da sentença
Acusação e defesa apresentaram na manhã desta quinta-feira (23) suas teses aos jurados que compõem o Conselho de Sentença do Tribunal do Júri da Comarca de Três Passos, no julgamento do médico Leandro Boldrini, 47 anos. O Ministério Público pediu a condenação do médico acusado de participação na morte do filho, Bernardo, de 11 anos, em abril de 2014.
Os sete jurados sorteados pela juíza Sucilene Engler Audino decidirão o destino do médico, que está preso há nove anos. Boldrini é acusado de planejamento e execução da morte (homicídio) do filho. ele também responde pela ocultação do cadáver da criança e por falsidade ideológica.
Enquanto o MP sustenta que o médico deve ser condenado à pena máxima, a defesa de Boldrini pede a sua absolvição. Os advogados sustentam que o pai de Bernardo é inocente. No júri anterior, de 2019, que foi anulado, o pai de Bernardo foi condenado a 33 anos e oito meses de prisão (30 anos e oito meses por homicídio, dois anos por ocultação de cadáver e um ano por falsidade ideológica).
O julgamento foi interrompido para o almoço retornou às 15h, com a réplica do MP (1 hora de duração) e a tréplica da Defesa (1h). Depois disso, o Conselho de Sentença se reunirá para decidir sobre o caso. Após, a juíza Sucilene retornará ao plenário para anunciar o resultado.
Promotores sustentam acusações
O Ministério Público é representado pelos promotores Miguel Germano Podanosche e Lúcia Helena Callegari. Eles acusam o réu dos crimes de homicídio quadruplamente qualificado (motivo torpe, motivo fútil, e emprego de veneno e dissimulação), ocultação de cadáver e falsidade ideológica (por ter registrado ocorrência policial do desaparecimento do filho mesmo sabendo o que tinha acontecido).
Para a acusação, Boldrini não só sabia que a mulher com quem era casado, Graciele Uguline, madrasta de Bernardo, odiava o enteado, e permitia que ela o maltratasse, como também arquitetou com ela o plano para matar o filho.
Bernardo seria estorvo para o casal
O menino seria um “estorvo” para o núcleo familiar formado com a filha do casal. E também queriam evitar que ele herdasse a herança da mãe, Odilaine Uglione (falecida). Bernardo era dopado com medicação de uso controlado, sofria abandono, maus tratos e tortura psicológica.
Também teria sido o médico quem disponibilizou o receituário para compra do medicamento ministrado para sedar o menino no dia do seu assassinato. Para o MP, os relatos das testemunhas, nos últimos dias, deixaram claros estes argumentos.
O romotor Miguel Podanosche foi o primeiro a falar, pedindo a condenação com “a pena máxima possível” para Leandro.
“Há inconsistências comportamentais muito grandes. Ele não só sabia que estava enterrado em uma cova rasa, como também concorreu para que isso acontecesse”, afirmou.
Casal já tinha até advogado
Podanosche citou o áudio de uma interceptação telefônica, mostrado ontem no plenário, datado de 14 de abril de 2014 (quando foi encontrado o corpo do menino), em que Graciele conversa com uma amiga.
Na ligação, que tem a participação do médico, a madrasta diz que, com o aumento das suspeitas sobre ela e com o boato de que seria determinada a sua prisão, o casal já havia contratado advogado.
“Leandro estava interessado em conseguir um habeas corpus para a companheira, já havia até um Advogado para isso. Os senhores ouviram, que entre sorrisos, Graciele e Leandro não davam a mínima para saber onde Bernardo estava”, argumentou o promotor.
Promotora lembra uso de medicamento
Lúcia Callegari seguiu, traçando uma linha do tempo, entre os dias 4 de abril de 2014 (uma sexta-feira), quando Bernardo foi medicado com Midazolam pela madrasta e seguiu com ela até Frederico Westphalen, onde foi morto.
No domingo, 6 de abril de 2014, Boldrini registrou o desaparecimento na Delegacia de Polícia. Em 14 de abril, depois que Edelvania Wirganovicz confessou o crime, o corpo de Bernardo foi encontrado. Neste dia, os três foram presos.
Lúcia argumentou que Boldrini sabia que Graciele maltratava o filho e também que ela saiu da cidade com o menino no dia do seu desaparecimento.
“Era do conhecimento do Boldrini que Keli (apelido de Graciele) odiava o Bernardo. Ele falou isso (depois que foi preso). Era tão público, que as pessoas que trabalhavam com ele sabiam, que as pessoas da comunidade sabiam”, afirmou a promotora.
MP traz outras situações a plenário
Para o MP, isso está claro também nos vídeos gravados no celular de Leandro, onde o casal e o menino discutem e a criança grita por socorro. E também através de audiência judicial em que é dito que a madrasta tentou matar o menino sufocado enquanto ele dormia, o que a deixou com ainda mais raiva.
O corpo de Bernardo apresentava a presença de Midazolam (sedativo). Dias antes do crime, houve o sumiço de ampolas deste medicamento no hospital onde trabalhava o réu e Graciele.
Além disso, Edelvania comprou a mesma medicação em uma farmácia, na antevéspera do crime, utilizando um receituário com assinatura e carimbo do médico.
O MP também sustentou que houve um acordo entre os Advogados dos envolvidos para que Boldrini fosse isentado do fato, a fim de que pudesse custear as defesas de Graciele e Edelvania.
“Hoje temos que encerrar esse capítulo condenando este psicopata, este crápula, este monstro que não merece as três letras que formam a palavra pai. Ele não sabe o que é isso”, finalizou a promotora.
Advogados de defesa sustentam inocência
Aos jurados, os advogados Rodrigo Grecellé Vares e Ezequiel Vetoretti pediram a absolvição de Leandro Boldrini. Argumentaram que ele não era um bom pai, mas que não tinha conhecimento nem participação no planejamento e execução da morte do filho.
Afirmaram ainda que nem a Polícia, que indiciou Boldrini, nem o Ministério Público, que o acusa, apresentaram provas cabais contra o médico.
“Leandro não foi um bom pai”, afirmou Grecellé. No entanto, pontuou o defensor, a discussão do processo é se o réu tinha amplo domínio do fato, atuou como mentor e incentivador do crime, da execução direta, arregimentou Edelvania e Evandro, criou álibis, patrocinou o crime e deu acesso ao medicamento. O defensor citou o depoimento das delegadas Caroline Bamberg Machado e Cristiane Braucks e sustentou que elas não tinham provas de que Leandro participou do crime.
Não há provas de que médico planejou matar, diz advogado
“Ao longo das interceptações, em que Graciele se mostra preocupada, não existe elemento que indique que ele era o mentor. As delegadas disseram que eles eram um casal, que conversavam no ambiente particular. Por que não providenciaram uma escuta na residência do casal? Elas responderam que tentaram, mas que o aparelho não funcionou. Se tivesse funcionado, seguramente, Leandro sequer seria preso ou processado por este fato”, afirmou Grecellé.
Ele Destacou também as interceptações telefônicas de familiares de Boldrini, apresentadas ontem pela acusação durante o depoimento do primo dele, Andrigo Rebelato. Segundo o advogado, não há declarações que mencionem a culpa do médico. “Ali é prova cabal de que ele não fez isso”, frisou.
Médico não teria conhecimento da morte do filho
Para o advogado, Leandro Boldrini não sabia que Graciele matou o filho, pois confiava nela.
“Uma relação de casamento é baseada no princípio da confiança. Leandro confiava, não queria acreditar que tamanha barbaridade tivesse acontecido”.
Já Ezequiel Vetoretti apontou erros nas investigações: “A imagem de Leandro Boldrini foi desfeita em rede nacional”, afirmou Vetoretti, ressaltando falhas da Polícia.
“Pela emoção que surgiu a partir deste caso, porque ela (Delegada Caroline) tinha que solucionar o caso e tinha o medo de, de novo, falhar (pouco antes da morte de Bernardo, uma jovem da cidade também foi assassinada e o crime não foi solucionado)”, explicou.
Vetoretti destacou o extrato de ligações telefônicas, “uma prova técnica”, que demonstraria que todos os finais de semana daquele ano (2014) Leandro e Bernardo conversavam, o que contraria os argumentos da Polícia de que o pai não ligava para o filho.
Sobre as acusações de que Leandro demorou para procurar o filho desaparecido, e que inclusive naquele final de semana foi a uma festa com Graciele, o advogado afirmou que o médico havia conversado com pelo menos nove pessoas que diziam ter visto Bernardo na cidade: “Tinha absoluta convicção de que ele tinha voltado de Frederico. Então, ele pensava, ‘o Bernardo tá aprontando uma’“.
O defensor citou também a reação de Boldrini quando foi preso, que ele teria se indignado e investido contra Graciele, após ela admitir participação no crime. E que o médico chorou e disse que “Bernardo não merecia”. Ressaltou ainda o depoimento de Edelvania Wirganovicz, que teria ouvido de Graciele que Leandro não sabia dos fatos, mas que “depois ele a agradeceria”.
Resultado de perícia é citado
Outro ponto ressaltado pela defesa foi o resultado inconclusivo da perícia grafotécnica sobre autenticidade da assinatura de Boldrini.
“O ponto de parada da assinatura demonstra que ela é de um falsário”, afirmou Vetoretti. “Esta é uma prova que demonstra que Leandro não assinou esta receita”, acrescentou.
Finalizando, Vetoretti apresentou o depoimento de um médico, colega de Boldrini, que exaltou a competência e dedicação dele enquanto profissional para salvar vidas. E encerrou sua explanação considerando “absurda” a acusação contra Leandro: “Destruíram a imagem dele para resolver o fato. Não há nada nos autos que demonstrem que Leandro mandou matar o filho.”
(Com informações de Janine Souza – Assessoria de Imprensa do TJRS)