Paralelo 29

Ministério Público Federal defende validade do júri que condenou réus pelo incêndio da Kiss

Foto: Fernando Frazão, Agência Brasil

Parecer da subprocuradora-geral da República Raquel Dodge foi encaminhado ao Superior Tribunal de Justiça, que julga recurso do MPRS

Confira a Íntegra do parecer no Recurso Especial 2062459/RS

O Ministério Público Federal (MPF) apresentou parecer contrário à nulidade do júri que condenou os quatro réus do processo principal do incêndio da boate Kiss, que matou 242 jovens e feriu outros 636, há 10 anos, em Santa Maria. O parecer é assinado pela subprocuradora-geral da República, Raquel Dodge.

No documento, Dodge pede que seja restabelecida a decisão do Tribunal do Júri que condenou os empresários Mauro Hoffmann e Elissandro Callegaro Spohr e os integrantes da Banda Gurizada Fandangueira Marcelo de Jesus dos Santos e Luciano Bonilha Leão por 242 homicídios e 636 tentativas de homicídio pelo incêndio de 27 de janeiro de 2013 na casa noturna.

O MPF é favorável ao recurso especial do Ministério Público do Estado do Rio Grande do Sul (MP/RS) contra acórdão do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJRS), que declarou nulo o julgamento feito pelo Tribunal do Júri em dezembro de 2021.

Decisão do TJ violou CPP, diz procuradora

Raquel Dodge rebate argumentos de advogados de réus da Kiss/Foto: Wilson Dias, Agência Brasil

Para Raquel Dodge, a decisão do TJRS violou dispositivos do Código de Processo Penal (CPP). Isso porque invalidou todo o julgamento com base em falhas técnicas na condução do júri, mas que foram apontadas pela defesa fora do prazo definido em lei e sem especificar os prejuízos causados aos réus.

Na avaliação de Dogde, a falta de contestação no momento adequado levou à chamada preclusão temporal, que consiste na perda do direito da defesa de se manifestar no processo. Por esse motivo, o Tribunal sequer deveria ter analisado os pedidos dos réus, que contrariaram as normas processuais.

No acórdão contestado, o TJRS acolheu recursos dos réus, que questionaram procedimento adotado para o sorteio dos jurados, assim como a realização de uma reunião reservada entre o juiz-presidente do Tribunal do Júri e o Conselho de Sentença do TJRS, sem a presença do MP e da defesa.

Segundo consta nos autos, houve três sorteios para a escolha dos jurados titulares e suplentes, sendo que as contestações foram apresentadas na véspera do último sorteio e após a realização do procedimento, sem demonstrar os prejuízos aos réus.

Além disso, de acordo com o parecer, o procedimento adotado no sorteio não violou o devido processo legal, nem foi determinante para a condenação aplicada.

Contestação fora de prazo

Júri da Kiss foi realizado em dezembro de 2021/Foto: TJRS, Divulgação

Em relação à reunião reservada, o MPF sustenta que a defesa deveria ter contestado a prática no momento em que os jurados foram convocados, quando o juiz poderia ter suspendido o convite ou chamado o Ministério Público e a defesa para participarem do ato.

“No entanto, a defesa preferiu silenciar, dando causa à preclusão, e somente suscitar referida nulidade após o desfecho condenatório desfavorável”, sustenta a subprocuradora.

Dodge contesta ainda outros dois pontos utilizados pelo TJRS para anular o júri: o questionamento quanto à validade de quesitos usados para a condenação e a alegada inovação acusatória, em razão de argumentos apresentados pelo promotor durante réplica no julgamento de um dos acusados.

Em relação ao primeiro ponto, o MPF lembra que a legislação processual possibilita à defesa participação ativa na elaboração dos quesitos (perguntas) que serão respondidos pelos jurados e servirão de base para a condenação ou absolvição.

Por esse motivo, o próprio CPP afasta a possibilidade de as partes questionarem posteriormente os quesitos estabelecidos, visto que elas deram o aval no momento da redação.

Dodge diz que não houve prejuízo aos réus

A subprocuradora-geral também afastou o argumento de “inovação acusatória”, por considerar que não houve prejuízo aos réus, visto que a defesa teve oportunidade de rebater os argumentos apresentados pelo promotor no momento da tréplica concedida durante o julgamento.

Para Dodge, nenhuma das falhas técnicas apresentadas pela defesa e acolhidas pelo TJRS comprometeu o contraditório, a ampla defesa ou o duplo grau de jurisdição e, por isso, não se justifica a anulação do júri.

Em dezembro de 2021, Mauro Hoffmann e Elissandro Callegaro Spohr, o Kiko, empresários e sócios da Kiss foram condenados juntamente com Luciano Bonilha Leão e Marcelo Jesus dos Santos pelas 242 mortes ocorridas na madrugada de 27 de janeiro de 2013, em decorrência do incêndio na boate.

Os réus também foram condenados por 636 tentativas de homicídios, crimes referentes ao número de pessoas feridas que sobreviveram a tragédia. Eles recorreram e conseguiram a anulação do júri.

CONDENAÇÕES DO JÚRI

  • Elissandro Callegaro Spohr, empresário e um dos sócios da boate – Pegou 22 anos e 6 meses de  prisão
  • Mauro Londero Hoffmann, empresário e um dos sócios da boate – Pegou 19 anos e 6 meses
  • Marcelo de Jesus dos Santos, integrante da Banda Gurizada Fandangueira – Pegou 18 anos
  • Luciano Bonilha Leão, integrante da Banda Gurizada Fandangeira – Pegou 18 anos

O incêndio ocorreu durante um show pirotécnico da Banda Gurizada Fandangueira, que se apresentava em uma festa universitária.

Uma faísca de um artefato atingiu a espuma que revestia o tóxico, dando início ao incêndio. A boate estava superlotada. Frequentadores morreram em decorrência da fumaça tóxica da espuma e de queimaduras provocadas pelo fogo.

(Com informações do MPF)

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