ALESSANDRA CAVALHEIRO – JORNALISTA
Desde as matérias em A Razão sobre a Rio 92 eu pensava uma coisa doida: Como se grita em páginas de jornal? Porque ouvindo os especialistas já podíamos perceber o anúncio de tragédias futuras. Hoje, se me permitem, quero gritar sobre a Cúpula da Amazônia, que acontece esta semana em Belém, Pará.
Neste 2023 os alertas estão exponencialmente maiores e ainda há uma inércia, principalmente de quem pode agir mais e melhor: quem polui em larga escala, quem produz combustível fóssil – a maior causa da fervura global. E quem faz as políticas. Sim, passou de aquecimento para fervura (não é palavra minha, mas da ONU).
Não dá para ninguém ignorar. Esta é a ferida mais antiga de nossa história, e teimamos em manter a cegueira e a inércia, porque quem sofre ‘são eles, não somos nós’. Só que não. Sofremos todos, no âmago de nossas células.
Cúpula da Amazônia
A Cúpula da Amazônia começa nesta terça, e há muito que dizer – e gritar aqui. Por que gritar? Porque há um termo assustador, horripilante, chamado ‘ponto do não retorno’, o que, em poucas palavras, significa que a Amazônia está próxima de se transformar em um tipo de ‘savana’, desertificada. Pense um pouco. Deserto!
Especialistas dizem que a parte sul do bioma já está chegando a este ponto. O que desespera e pede gritos é que, sim, isso pode ser evitado, ou amenizado. Sabemos que os povos originários não agridem o bioma, buscam conviver em harmonia com as florestas, ao contrário de muitos caras-pálidas grandões.
O censo 2023 diz que temos 1,7 milhões de indígenas no Brasil hoje. Eles são os guardiões das florestas. Ponto. Neste momento eles movem céu e a terra para chegar a Belém, chamada pelos ambientalistas de ‘Cidade da Esperança’.
Mas ainda há muita luta para que sejam ao menos reconhecidos como gente que merece viver, porque sim, eles têm sido dizimados ao longo da nossa história contada.
Soluções à mesa
Recebi hoje informações sobre um estudo inédito do Instituto Escolhas que, pela segunda vez, calcula o investimento necessário para o cumprimento da meta brasileira no Acordo de Paris (2015). Os novos dados dizem que o Brasil pode ganhar R$ 776,5 bilhões ao recuperar 12 milhões de hectares de florestas.
Segundo as conclusões, ao recuperar 12 milhões de hectares de florestas, o país pode gerar 2,5 milhões empregos e remover 4,3 bilhões de toneladas de CO2 da atmosfera até 2030.
Então, sim, é possível, matematicamente. Para cumprir a meta, o Brasil precisa investir R$ 228 bilhões. Como viabilizar este recurso é um assunto considerado fundamental pelo Instituto, durante a Cúpula da Amazônia, que reúne os oito países onde ela existe.
“A recuperação desses 12 milhões de hectares promete gerar índices expressivos de emprego e renda, enquanto remove 4,3 bilhões de toneladas de CO2 da atmosfera.
É uma combinação perfeita entre a agenda socioeconômica e a agenda de mitigação da crise climática”, afirma o diretor executivo do Instituto Escolhas, Sergio Leitão.
Leitão afirma que, especialmente o presidente Lula deve propor esta discussão, já que “não é mais possível falar em desenvolvimento sustentável sem falar em recuperação florestal.”
Provocação
A assessoria de imprensa do Instituto Escolhas ainda enviou uma informação a ser lembrada e espetada na consciência de todos, sobre a inércia e o descaso com o assunto por parte das autoridades: O primeiro estudo sobre o investimento necessário para o cumprimento da meta brasileira, Quanto o Brasil precisa investir para recuperar 12 milhões de hectares de florestas?, lançado meses depois da assinatura do Acordo de Paris, em 2015, chegou à cifra de R$ 52 bilhões.
De lá para cá, apenas 79,1 mil hectares foram recuperados. “Isso é menos de 1% da meta original. E, agora, temos que correr atrás do passivo gerado, do custo de não termos feito nada.
Não podemos perder de vista, no entanto, que os resultados compensam o investimento, ainda que ele esteja quatro vezes maior”, provoca o diretor do Instituto Escolhas, Sérgio leitão.
Já passou da hora, mas ainda dá tempo de adiar o fim do mundo, como disse o líder indígena Ailton Krenak. Sim, tudo vai acabar, mas que seja algo natural. Não precisa ser assim, uma tragédia ativada com o motor da ignorância da humanidade.