Paralelo 29

RODRIGO DIAS: O que os consumidores precisam saber o caso 123 milhas

Defensoria Pública de Minas Gerais entra com ação contra 123Milhas. Foto: Rafa Neddermeyer/Agência Brasil

RODRIGO DIAS – ADVOGADO E ESPECIALISTA EM GESTÃO PÚBLICA

No dia 18/8/2023, a 123milhas, uma empresa atuante no ramo de viagens, anunciou a não emissão de passagens da linha “Promo” com embarques programados para setembro a dezembro de 2023.

Essa medida causou preocupações e dúvidas entre os consumidores, chegando a chamar a atenção dos ministérios da Justiça e do Turismo, que estão avaliando possíveis investigações.

Este artigo tem como objetivo esclarecer os direitos dos consumidores afetados por essa situação, destacando a legalidade da imposição de vouchers como forma de reembolso e explorando os fundamentos legais que protegem os direitos dos consumidores.

Os direitos dos consumidores estão respaldados pelo Código de Defesa do Consumidor (CDC), um conjunto de normas legais que estabelecem regras e garantias nas relações de consumo. O artigo 1º do CDC define essas normas, realçando a sua natureza de ordem pública e interesse social.

Portanto, é importante compreender que os consumidores possuem direitos legalmente assegurados em situações como a que a 123milhas apresentou.

Justiça do RJ obriga 123Milhas a garantir ressarcimento de clientes

Frente à situação, a empresa 123milhas ofereceu vouchers como alternativa de reembolso para os consumidores afetados. É essencial entender que os consumidores não são obrigados a aceitar exclusivamente essa opção.

Conforme previsto pelo CDC, os consumidores têm o direito de exigir o reembolso da quantia paga de acordo com a forma original de pagamento, como estorno no cartão de crédito ou restituição em dinheiro. Isso oferece aos consumidores a liberdade de escolha na maneira como desejam recuperar o valor investido.

A comercialização de passagens com datas flexíveis acarreta em um risco assumido pela 123milhas. Nesse contexto, é fundamental saber que, em caso de cancelamento unilateral, os consumidores possuem o direito de demandar tanto o cumprimento da oferta inicial quanto a devolução integral do valor pago.

É importante ressaltar que a responsabilidade do fornecedor em relação a falhas no serviço é objetiva, ou seja, independe da comprovação de culpa por parte da empresa.

O CDC tem o propósito de coibir práticas abusivas e, portanto, invalida cláusulas contratuais que impeçam o reembolso da quantia paga pelos consumidores. Ao estabelecer os vouchers como única alternativa de devolução, a empresa contraria essas diretrizes legais que protegem os direitos dos consumidores.

O princípio da confiança é um aspecto relevante a ser considerado. Ele estabelece que o consumidor tem expectativas legítimas sobre os produtos e serviços adquiridos. O cancelamento unilateral seguido da imposição de vouchers prejudica essa confiança que o consumidor depositou na empresa, levando à perda da relação de confiança estabelecida anteriormente.

Em circunstâncias semelhantes, a desconsideração da personalidade jurídica da empresa pode ser aplicada, o que responsabiliza também os sócios. Essa medida visa garantir a reparação dos danos causados aos consumidores, sendo um importante mecanismo de proteção.

É crucial destacar que, quando se trata da responsabilidade da empresa em relação às passagens aéreas promocionais, a empresa deve assumir os riscos inerentes às ofertas que disponibiliza. Ao oferecer pacotes com datas flexíveis, a empresa automaticamente se coloca diante desses riscos. Portanto, não é justo que o consumidor sofra as consequências de erros cometidos pela empresa. Diante de situações em que a empresa recusa o cumprimento da oferta, o consumidor possui o direito legítimo de exigir que a oferta seja cumprida conforme foi originalmente estipulado.

Esse entendimento sobre a responsabilidade da empresa é compartilhado por outro especialista. De acordo com o Código de Defesa do Consumidor, em seu artigo 20, o fornecedor é diretamente responsável por eventuais problemas decorrentes da prestação de serviço. Essa responsabilidade é considerada objetiva, o que significa que não é necessário comprovar culpa por parte do fornecedor. Dessa forma, quando um consumidor é prejudicado devido a falhas no serviço prestado pela empresa, esta última tem a obrigação de corrigir esses danos.

https://www.tjrs.jus.br/novo/noticia/123-milhas-e-condenada-a-ressarcir-valores-e-indenizar-por-dano-moral/

No que diz respeito aos vouchers oferecidos como forma de reembolso, os especialistas concordam que os consumidores afetados não estão obrigados a aceitá-los. Ainda que seja uma alternativa, os consumidores não são compelidos a aceitar a restituição por meio de vouchers. O correto seria que a devolução do valor ocorresse pela mesma forma de pagamento inicialmente utilizada na compra, devidamente atualizada monetariamente. A imposição exclusiva dos vouchers como opção de reembolso é considerada uma prática abusiva por parte da empresa.

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Essa situação, onde apenas os vouchers são oferecidos, configura claramente um descumprimento de oferta. Os consumidores adquiriram as passagens aéreas com a legítima expectativa de realizar suas viagens. No entanto, foram surpreendidos por um cancelamento unilateral e abusivo por parte da empresa, seguido pela tentativa de impor os vouchers como única solução. Importante frisar que, mesmo que haja previsão contratual para essa ação, ela é considerada nula conforme o Código de Defesa do Consumidor, conforme detalhado nos artigos 51, incisos I, II, IV, IX, XI, XIII e XV.

Nesse contexto, o Código de Defesa do Consumidor, por meio do artigo 35, ampara os consumidores. Isso significa que os consumidores têm o direito de escolher entre a realização da viagem conforme a oferta inicial, a possibilidade de cancelar a compra e receber a devolução integral do valor pago, devidamente atualizado monetariamente, além de compensação por eventuais perdas e danos, ou a opção de optar por um serviço equivalente.

Com base nesses fatos, fica evidente que a empresa não deve transferir aos consumidores as consequências de suas decisões. Em situações como essa, é fundamental que os consumidores prejudicados estejam cientes dos seus direitos e busquem soluções para preservar seus interesses. Seja por meio de canais de reclamação ou, se necessário, por meio de processos judiciais. A situação reforça a importância de compreender e exercer os direitos do consumidor diante de práticas abusivas e descumprimento de ofertas por parte das empresas.

Se você se encontra em uma situação onde se sente prejudicado, é importante saber que existem medidas que podem ser adotadas para buscar uma resolução. Os especialistas recomendam começar pelo caminho da reclamação administrativa, que visa resolver o problema de maneira amigável, sem a necessidade de recorrer a medidas judiciais. A seguir, apresento algumas opções que você pode considerar:

  1. Consumidor.gov.br: Este é um site que hospeda a plataforma do Procon em âmbito nacional, porém, apenas para empresas participantes, como é o caso da 123 Milhas. Essa ferramenta possibilita que você registre sua reclamação e busque um diálogo direto com a empresa para resolver a questão.
  2. Reclame Aqui: Trata-se de um site privado que permite a publicação de reclamações públicas sobre qualquer empresa. Pode ser uma maneira de expor o problema de forma pública e incentivar a empresa a buscar uma solução.
  3. Contato por E-mail: Entrar em contato diretamente com a empresa via e-mail é uma alternativa. Certifique-se de documentar todas as suas comunicações para manter um registro claro do que foi discutido.
  4. Ligação para a 123 Milhas: Caso prefira entrar em contato por telefone, é importante anotar detalhes como número de protocolo, nome do atendente, data e horário da ligação. Essas informações podem ser úteis caso você precise referenciar a conversa posteriormente.

Se, mesmo após tentar essas abordagens, você não conseguir solucionar o problema de maneira amigável, pode ser necessário buscar orientação especializada. Nesse caso, recomenda-se entrar em contato com um advogado o mais rápido possível. Um profissional qualificado poderá avaliar a situação, entender seus direitos e, se necessário, orientá-lo no processo judicial.

Lembre-se sempre de documentar todas as suas interações, mantendo registros claros das comunicações e guardando cópias de documentos relevantes, como contratos e comprovantes de pagamento. Esses registros podem ser fundamentais caso seja necessário comprovar fatos no futuro. Agir de maneira informada e proativa é fundamental para proteger seus direitos como consumidor.

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