JOÃO EICHBAUM – ESCRITOR
À fúria com que a natureza se abateu sobre o Rio Grande do Sul, na semana passada, ninguém poderia se manter alheio, frio, indiferente.
Em momentos como esse, se aguça em muitas pessoas o sentimento gregário do animal humano, e a solidariedade se concretiza das mais diversas formas, dependendo das disponibilidades de cada um.
Na imprensa, a pura e simples divulgação das notícias, principalmente as atinentes a desgraças que roubaram vidas, destruíram famílias, deixaram gente ao relento, têm o seu lado positivo, despertando a vontade de ajudar.
Mas, há também o lado opinativo da imprensa, do qual não se desvincula uma alta dose de subjetividade. A jornalista Rosane Oliveira, da Zero Hora, é conhecidíssima pelo seu talento em analisar política.
A impressão que se tem é de que, mesmo que ela queira, não consegue se abstrair da política, diante de fatos que não são políticos por natureza, como esses que, movidos pela fúria das águas, com um horror de mitologia bíblica, causaram tragédias no Estado.
Em sua coluna, diz a referida jornalista que “a presença do prefeito, do governador ou do presidente em locais que enfrentam uma tragédia climática é menos importante do que as medidas concretas que os governos adotam”.
Mas, depois dessa verdade dogmática, ela envereda para o lado que seu filão jornalístico não dispensa: a política. Então, afirma: “levar conforto aos que perderam parentes e mostrar que está ao lado deles é próprio dos líderes”.
Nada disso. A solidariedade das “lideranças” se concretiza com a transformação dos impostos em proveito do povo – e não no estelionato do abraço eleitoral patrocinado pelo infame fundo partidário.
O povo paga impostos pelo direito à vida, com pontes e estradas seguras, desassoreamento de rios – e não para ouvir palavras de consolo.
A dor de ninguém sumirá com a presença de um político. A perda de um ente querido não encontra consolo em abraços, apertos de mão, batidinha nas costas.
O desespero de quem ficou apenas com a roupa do corpo, tiritando de frio e de medo, à espera de socorro, jamais será uma lembrança apagada ou um trauma debelado pelos afagos de gente que só é movida por ambições políticas.
O Lula, é claro, não ficou de fora das considerações genuinamente políticas. Ele “poderia descer em Lajeado e ali fazer ao vivo uma manifestação de conforto”, assinala a colunista.
Dado o tom, o coral da grande imprensa entoou um clamor, pela ausência do Lula, como se a presença dele pudesse realizar o milagre da reposição de todas as coisas no lugar, devolvendo ao povo, machucado pelas perdas e lutos, a paz e a reconciliação com a vida. Como se Lula fosse o arco-íris em pessoa, ou encarnasse Moisés, recuando os rios para dentro de seus leitos.
Só aos verdadeiros analistas pode acudir a evidência de que, embriagado pela exacerbação de seu ego, Lula se sentia mais importante entre os tiranos que apoiam o bandido Putin, do que no cenário de uma das maiores desgraças deste país.