ALESSANDRA CAVALHEIRO – JORNALISTA
O caso do afundamento da mina em Maceió tem sido muito falado na imprensa nas últimas semanas. É mais um exemplo de história de exploração abusiva que estava guardado na gaveta das tragédias ambientais. Aqui, uma reflexão sobre a extrema dificuldade da imprensa na hora de investigar e denunciar esses abusos com antecedência.
Um artigo do jornalista Marcelo Soares no Linkedin chama atenção para essa questão. Ele lembra que há cinco anos a capital alagoana vem afundando e que o êxodo de população nos bairros mais afetados aparece até no Censo de 2022. Com pouca cobertura do desastre e muitas menções de sucesso da Braskem no mercado, só agora o ‘gigante’ ganha maior repercussão no noticiário.
Marcelo fez uma pesquisa das notícias sobre a mina em Maceió. “Então, no jornal que eu mais li com atenção na vida (Folha), onde trabalhei por vários anos importantes da minha carreira, o desastre de Maceió é assunto para a editoria Cotidiano, enquanto os negócios da Braskem são assunto para a editoria Mercado.
Tudo bem que o desastre é consequência dos resultados que a empresa buscou, mas isso passa batido na cobertura”, critica.
Estamos acostumados a esperar a explosão, as mortes, o desespero, para descrever os fatos. É muito difícil levantar e divulgar os riscos de desastres relacionados à irresponsabilidade e à ganância das grandes corporações em tempo de salvar vidas e o ambiente. O trator vai passando por cima e calando a boca de quem ousa. Dourando a pílula. Que democracia é essa?
E note que hoje, chegamos a um ponto em que os grandes do mercado clamam por ‘liberdade’ (vide o recém-eleito Javier Milei na Argentina, que defende essa ‘liberdade’ assombrosa de privatizar tudo até afogar na lama aquilo que é coletivo).
Foi assim com a Vale. Duas vezes, Mariana e Brumadinho. Os jornalistas precisam estar dispostos a serem heróis: arriscar o emprego, o sustento da família, e até a própria vida para levar esse tipo de situação ao público e tentar, de alguma forma, evitar.
Porque muitas vezes são engolidos pelos gigantes que estão deitados confortavelmente na economia do país. No entanto, é preciso perseverar.
Entre colegas que trabalham com jornalismo ambiental, o comentário é que há muita dificuldade de cobertura em Maceió, porém a reflexão de Marcelo Soares faz todo o sentido.
Afinal, os manda-chuvas da mídia alagoana (incluindo a família Collor), e a nossa democracia tão frágil não permitem descortinar a realidade, a dor, as consequências. Como telespectadores há um desejo secreto, sutil, de assistir à imagem de milhões, o chão desabando e bairros inteiros sumindo (já vimos algo parecido, porém menor, na Amazônia).
O fato é que sabemos do potencial de tragédias gigantescas e não há muito que fazer, a não ser acompanhar, descrever e mostrar os resultados terríveis.
Assim ocorre com a cobertura da emergência climática. Há muitos casos na gaveta. Sabemos que cientistas tentam avisar de situações críticas há mais de 40 anos.
Mas os gigantes que irão estremecer a terra estão deitados confortavelmente nas notícias de sucesso no mercado e lindas propagandas no horário nobre das TVs.
Na COP Dubai, que termina amanhã, 12, está clara a diferença entre os atores. Os jovens líderes, os indígenas (quem mais sabe amar a terra), cientistas do clima, que tentam desbravar um futuro viável e os gigantes confortáveis, com imenso potencial para provocar tragédias, reinando absolutos.
Até quando, senhoras e senhores, o lucro exorbitante será mais importante que a vida? Como sempre, tenho deixado aqui mais perguntas do que respostas. Essas, precisamos construir juntos.