ATHOS RONALDO MIRALHA DA CUNHA – ESCRITOR
Os banhos de chuva são as lembranças mais lúdicas que tenho da infância. E quando sou pego por uma tromba d’água na rua não me importo em chegar todo encharcado em casa. É uma maneira de reviver o piá que fui há mais de 50 anos.
Tanto em Santiago, quando a chuva me pegava na volta da escola Silvio Aquino, como em Ramiz Galvão nas férias de final de ano na rua José Ferrador.
Era comum os banhos de chuva no verão e uma piazada em algazarra. E depois um cafezinho quente com cueca-virada que a vó fazia para os netos. Á noite, o sono era embalado com a chuva no telhado de zinco. Quem nunca se sentiu aconchegado pelo barulho da chuva no zinco?
Mas as chuvas não são mais as mesmas da nossa infância e da nossa memória afetiva dos lugares. A enchente de 41, que era apenas fotografias nos álbuns antigos, retorna revigorada e avassaladora em 24.
Ultimamente, uma chuvarada é motivo de pânico e desgraça.
O Rio Grande do Sul enfrenta uma das piores catástrofes climáticas de sua história. As chuvas persistentes em volumes alarmantes fazem uma devastação como um filme de terror e o estado já está em situação de calamidade.
Uma combinação de fatores intensificou as chuvas e resultou na tragédia que estamos testemunhando. O aquecimento global afeta os padrões climáticos, tornando eventos extremos mais frequentes e intensos, só para citar um dado importante e que não podemos negar.
Em meio a essa fatalidade, também surgem histórias inspiradoras de pessoas que ajudam os animais. Uma garota corajosa salvou dois cavalos, enquanto um rapaz demonstrou amor e dedicação ao adotar um gatinho solto em meio a lama.
Comovente os resgates de pessoas nos telhados das casas e um senhor à deriva apoiado em um tronco de árvore. Comovente essa corrente de solidariedade.
Nesta semana, no supermercado, uma pessoa estava com o carrinho de compras abarrotado com garrafas de água mineral. Um posto de gasolina chegou a negociar a R$ 9,00 o litro.
Eu, simplesmente, não sei o que dizer, mas essas atitudes dizem tudo o que elas são. Esse momento exige empatia e doação. E não individualismo e ganância.
Solidariedade… muita solidariedade e mão na massa. É isso que precisamos.
Devemos superar essa situação de calamidade com muito trabalho e perseverança. E que na próxima chuva seja possível um cafezinho preto contemplando o arvoredo e dormir com o barulho da chuva no telhado.
E que os rios sigam seu curso normal lá no leito deles.