Paralelo 29

POESIA: Ocasos

Foto: Pixabay

EDINARA LEÃO

Respingada de ocasos,

era tarde e

não foi preciso anunciar a partida.

Houve uma curva no desmembramento,

eu estava estufada de dias de névoa.

Não anunciava o abatedouro,

os dias já se apartavam do tempo arredio.

Cansada de andar,

a confusão dos caminhos devorava-me.

Aquele não era o barco de mim.

Do dentro de mim, desprende-se um elo.

E, na corda bamba do palhaço,

cerca-me o tempo da lucidez.

Não há como não ver.

Os panos caídos dos palcos desprendem-se.

Tarda a noite a desatar a tarde.

Se só eu vejo,

dai-me, senhor dos descompensados,

olhos de não ver.

Não quero ver além da pele pétrea das gentes

que não são nada além do que peles com sopro.

E, se são apenas pedras que andam,

deveriam saber o segredo das pedras,

mas já despersonificadas

da agonia do andar,

ignoram o segredo e se desviam.

Assisto agora ao paramento

de minha constância.

Haverá outro lugar

além do des-fim e do des-mundo

para descansar uma alma?

Eu que me acerco do novelo

e o percebo sem fio

para tecer os dias de agora.

Os olhos do passado sangram

a agonia do tempo.

Só há um barco e os pés

não alcançam o porvir.

Era época de invernos,

mas o outono achegou suas folhas

de amarelo plátano.

Rasgaram o último dos véus.

Já não posso ver.

Assisto ao paramento de meus dias.

Eu nada.        

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