Paralelo 29

PARALELAS: Há exatos 30 anos, em Santa Maria, Bolsonaro revelou o sonho de governar o Brasil em um regime de exceção

Foto: Reprodução jornal Centro Sul

POR JOSÉ MAURO BATISTA – EDITOR DO SITE PARALELO 29 E REPÓRTER À ÉPOCA

O registro consta nas páginas do jornal Centro Sul, um semanário que circulou em Santa Maria no início dos anos 90 e que, certamente, os mais novos moradores da cidade nunca ouviram falar.

O veículo foi um dos que cobriu a visita do então deputado federal do PPR-RJ (atual Progressistas) à cidade em 18 de junho de 1993, história que o site Paralelo 29 resgatou.

Como a coluna Paralelas registrou em textos anteriores, a vinda do capitão deputado mobilizou a imprensa local. Na época, o visitante não tinha nem perto da popularidade que tem hoje.

PARALELAS: O que disse Bolsonaro em sua turbulenta visita a Santa Maria há exatos 30 anos

Edição de jornal local focou na visita turbulenta

Na sua edição semanal datada de 25 de junho a 1º de julho de 1993, o Centro Sul dedicou praticamente todas as suas páginas à visita do deputado federal. E não poupou Bolsonaro de críticas contudentes pelas declarações que ele deu em uma entrevista na Câmara de Vereadores.

Capa da edição do jornal Centro Sul dedicada à visita de Jair Bolsonaro a Santa Maria em 18 de junho de 1993/Foto: Reprodução

Na capa, o jornal colocou uma manchete atacando o político: “Bolsonaro, o pré-histórico. República Dinossaura exuma fóssil do AI-5”. Nas páginas internas, o jornal deu mais espaço à opinião de seu editor do que à cobertura da visita propriamente dita.

No artigo interno, o jornalista que assina o texto escreveu: “O DITADOR COM SOTAQUE DA RESERVA. Dinossonaro. Treinado para matar”.

Naquela semana estrearia nos cinemas o filme Jurassic Park (Parque dos Dinossauros), sucesso de bilheteria do consagrado diretor Steven Spielberg.

E como Santa Maria já era, naqueles tempos, candidata a ser reconhecida como Berço dos Dinossauros, o jornalista aproveitou a deixa e comparou o capitão que recentemente estreara na política a um ser pré-histórico por suas ideias ultrapassadas.

Artigo publicado pelo jornal Centro Sul esculacha com as declarações do então deputado Bolsonaro em Santa Maria/Foto: Reprodução

PARALELAS: A barulhenta e profética visita de Bolsonaro a Santa Maria há exatos 30 anos

Uma declaração histórica e profética

Mas a matéria do Centro Sul traz uma informação interessante: uma declaração em que Bolsonaro diz que seu sonho seria “governar o Brasil em um regime de exceção”.

De fato, já naquela ocasião, Bolsonaro se apresentou como um porta-voz dos militares descontentes com a democracia e se comportou como candidato a realizar as tarefas que, no seu entendimento, o Brasil precisava colocar em prática. Para isso, o chefe da Nação teria que ter poderes totais.

Bolsonaro tinha até uma espécie de plano de governo com quatro eixos: fechamento temporário do Congresso Nacional, redução do número de deputados e senadores, implantação de um rígido controle de natalidade (a coluna falou sobre isso em registro anterior) e acabar com a ciranda financeira.

A reação do meio político

Uma das reportagens sobre a visita de Bolsonaro em junho de 1993/Foto: Reprodução
Manchete do jornal A Razão/Foto: Reprodução
Jornal A Razão, único veículo impresso diário da época, mancheteou visita/Foto: Reprodução
Desdobramento da visita no jornal A Razão/Foto: Reprodução
Documento histórico: Requerimento de Paulo Pimenta para declarar Bolsonaro Persona non Grata/: Reprodução, Arquivo da Câmara de Vereadores de Santa Maria

Nas reportagens produzidas pelos jornais A Razão e Centro Sul, é possível encontrar recortes com as reações de políticos locais e até em nível nacional às declarações de Bolsonaro.

Os vereadores de Santa Maria foram os primeiros a agir. Paulo Pimenta (PT), Valdeci Oliveira (PT), Maria Gessi Bento (PC do B), Cláudio Rosa (MDB), Abdo Mottecy (MDB) e Vicente Paulo Bisogno (PDT) assinaram um requerimento que resultaria em uma moção de repúdio, na cassação do título de Visitante Ilustre e na aprovação do título de Persona non Grata a Bolsonaro. Pimenta puxou a frente.

O empresário Vitorino Da Cás, que presidia o partido de Bolsonaro na cidade, disse que a posição do deputado ia contra os princípios do PPR. “Ele bobeou”, afirmou o dirigente.

Conforme os registros da época, o deputado federal gaúcho Adylson Motta, também condenou as declarações do colega de partido. E outros correligionários teriam sido ainda mais contundentes, defendendo a expulsão do capitão das fileiras partidárias.

As conclusões sobre o Bolsonaro de 1993 e o de 2023

A coluna encerra uma série de três artigos de resgate histórico sobre a visita de Jair Bolsonaro a Santa Maria em 18 de junho de 1993 com algumas conclusões:

1) Bolsonaro não mudou um milímetro em relação a 1993 (o que mudaram foram algumas pautas incorporadas mais tarde na agenda de Bolsonaro e uma vigilância maior das instituições em relação a discursos que questionam a democracia)

2) Desde que se lançou na política (antes mesmo de ser eleito para um cargo eletivo), Bolsonaro procurou agir como um líder de setores militares descontes, principalmente aqueles ligados umbilicalmente ao regime militar

3) Já em 1993 era possível perceber que Bolsonaro sonhava governar o país, de preferência sem nada e sem ninguém para impedi-lo de colocar em prática o que pensa

4) Com algumas exceções (como o PT), as reações do meio político tiveram mais a ver com o momento de redemocratização que o país vivia e com o desgaste de 21 anos de governos militares do que propriamente indignação com o que dissera o capitão. A prova disso é que 30 anos depois, a moção de repúdio e o título de Persona non Grata jamais seriam aprovados pela atual Câmara de Vereadores

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