JOÃO EICHBAUM – ADVOGADO E ESCRITOR
De um momento para outro, alguns deputados descobriram que o Supremo Tribunal Federal está usurpando as funções legislativas. Quem tomou a iniciativa de denunciar esse comportamento foi a Frente Parlamentar da Agropecuária.
No levante contra indevida intromissão do Judiciário, ela arrastou consigo as da Segurança Pública, dos Produtores de Leite, dos Contra as Drogas, dos Evangélicos e dos Católicos.
Nunca, na história brasileira, a sociedade havia se dado conta de que existe um tribunal superior, composto por pessoas com larga experiência de vida mas que, apesar de toda essa bagagem, não são conduzidas por regras primárias de exegese, que evitariam a incrustação de atividade legiferante em suas decisões. O ato de julgar exige meditação, análise, silêncio e solidão.
Tais requisitos estão muito longe de quem se entrega à exposição pública e se torna personagem de noticiários da imprensa. O juiz que assim se comporta, acaba sendo julgado pela opinião pública.
E esse julgamento a que se expuseram os ministros do Supremo Tribunal Federal não ficou em segredo de Justiça. As primeiras críticas apareceram nas redes sociais com ironias, ataques diretos e humor escaldante.
A imprensa que, de um modo geral, costumava tratar o STF como entidade intocável, merecedora de mesuras e genuflexões, só se manifestou, quando a desilusão com a Justiça já era um assunto que enchia a boca do povo e se tornava pauta para corajosos colunistas que não temem toga.
Recentemente até editoriais de grandes órgãos da imprensa se deram o direito de ingressar no coro das críticas, pondo de lado seu temor reverencial.
Não foram poucas as vezes em que, servindo de eco para as manifestações contra a fria indiferença do Parlamento, diante de decisões do STF que ultrapassavam a linha divisória das atribuições dos Poderes, a imprensa denunciava o silêncio omisso da Câmara e do Senado.
Mas agora, quando algumas decisões daquele Tribunal passaram a mexer nos interesses de certos grupos, deixando transparecer que o grito de guerra dos caciques e rezas dos pajés soam melhor nos ouvidos da Justiça do que o discurso do agronegócio, parece que o Parlamento se acordou.
Agronegócio é dinheiro e quem patrocina muitos mandatos parlamentares é esse dinheiro. Mandatários que não atendem aos interesses dos mandantes se arriscam a perder os mandatos. O mesmo raciocínio vale para a Frente Parlamentar dos Produtores de Leite.
Ao demarcar o território indígena, restringindo a área utilizada por agricultores e pecuaristas, o Supremo Tribunal Federal mexeu num abelheiro. A imediata resposta do campo e da lavoura foi firme, decidida: paralisar o Congresso, para que ele trate de preservar sua independência.
Os representantes do povo, que clama por segurança, vendo, na perspectiva da liberação das drogas, um reforço para o crime, aderiram à rebeldia.
Com seu voto, Rosa Weber revolveu o estômago dos cristãos, despertando neles a lembrança de Herodes, o matador de criancinhas.
Foi a vez dos religiosos aderirem à exigência de respeito à competência do Legislativo. A maioria parlamentar, representando o povo, está advertindo o STF: aprendam a interpretar, sem legislar.