JOÃO EICHBAUM – ADVOGADO E ESCRITOR
“O rato roeu a roupa do rei e a rainha de raiva roeu o resto”. Era assim que as professoras ensinavam a pronúncia correta do “erre” no início da palavra.
A imprensa internacional tem se ocupado discretamente com um câncer que está molestando o rei da Inglaterra. Socorridos pela lembrança da frase das professoras, os mais antigos estão se perguntando maliciosamente: não terá o rato roído o relho do rei?
Acontece que, para o mundo curioso, o câncer do rei está em lugar incerto e não sabido, e essa curiosidade dá margem a muitas conjecturas maliciosas, supondo que o atingido seja o instrumento de procriação de Sua Majestade.
Só um órgão assim tão íntimo poderia exigir reserva com relação a uma doença assaz conhecida. Principalmente em se tratando de um rei com uma história de acasalamentos em leitos distintos.
Não é segredo para ninguém que ele tirava folga da rotina com a patroa, para se entreter com a outra, chamada Camila. Claro, debaixo dos lençóis, em entretimentos íntimos, ninguém quer ouvir música sacra.
O que o então príncipe Charles queria ouvir eram aqueles gritinhos e gemidos, que a rotina do sacramento matrimonial enxota.
A partir dessas virtudes do rei, as reservas sobre a localização de seu câncer geram fantasias entre os machos. Daí a chamarem de “vara” ou “relho” o instrumento de procriação de sua majestade é um passo.
Isso porque, o hímen, aquela porta de carne que só se abre para que seja tirada lá de dentro a virgindade, é um ato heroico que tem que ser realizado meio na porrada, para tirar proveito do “ponto de ebulição” provocado por beijos, carícias e adjetivos excitantes. E outra: é um verdadeiro relho, que dá a largada na corrida dos espermatozoides atrás de óvulos.
Mas, o fato é que um câncer pegou o rei em algum lugar impronunciável e a imprensa mundial trata disso como coisa incomum, como se o rei não fosse feito dessa matéria perecível de que são constituídos os animais.
Quem quer que tenha sido aquele que incutiu, em parcela considerável da humanidade, a ideia de que reis e rainhas se distinguem dos demais animais humanos, pouco importa.
O certo é que essa futilidade caiu no terreno fértil dos cérebros que dispensam a cognição, dando prevalência ao devaneio. As carências, que dominam grande parte da humanidade, é que são responsáveis pela criação de deuses e ídolos de toda espécie.
Aliviar os intestinos, esvaziar a bexiga e atender às exigências da testosterona são funções biológicas, condicionadas pela natureza à vida, nas mais diferentes espécies de animais.
Elas nivelam todos os humanos, sem qualquer distinção. Ninguém escapa de suas armadilhas e exigências: naquela hora em que os intestinos entram em serviço, e a bexiga não quer nem saber se seu portador está rezando missa, ou passando em revista as tropas, todos são iguais: do mendigo ao rei, da prostituta à rainha, do coroinha ao papa. E das reações da testosterona não há reza que nos livre, amém.