ALESSANDRA CAVALHEIRO – JORNALISTA
Quando me deparo com notícias sobre violência nas escolas, é sempre um soco no coração. Essa semana, soube de dois casos de alunos se agredindo com facas, sendo um em Santa Maria, em frente ao Colégio Cilon Rosa.
No meu período escolar nunca presenciei ataques, a não ser quando coleguinhas trocavam pontapés na fila. Aliás, na infância, eu nem sabia dos males do mundo, sendo que as malditas guerras sempre estiveram nas pegadas da humanidade.
Na verdade, eu sofria bullying porque tinha a língua presa e minhas palavras acabavam bem distorcidas quando eu trocava o r pelo g.
Imagine aí, eu pedindo uma carona. Nunca faltava um engraçadinho para fazer seu comentário infeliz. E a cidade natal de um dos meus mestres queridos da literatura, Ignácio de Loyola Brandão: Araraquara. Era pra acabar.
Eu não fazia ideia do quanto isso iria me prejudicar no futuro. Até achava engraçados os comentários. Quanta inocência.
Hoje eu sei bem o resultado: escolhi focar no impresso na Comunicação porque minha voz foi se calando com as perplexidades da vida. Eu não soube lidar, mas talvez ainda haja tempo para mais esta cura. Oremos.
Onda extremista
Mas o que é o meu trauma, diante da violência extrema que estamos testemunhando nos últimos tempos? Li que este fenômeno contemporâneo foi estudado pelo Grupo de Trabalho de Especialistas em Violência nas Escolas do Ministério da Educação, instituído em junho de 2023.
O relatório traz dados interessantes e propõe políticas de enfrentamento ao problema. Já é uma luz. O quanto essas políticas estão sendo implementadas é que é a questão.
O elemento central da violência nas escolas é o extremismo. Muito preocupante, já que em boa parte do mundo, as políticas estão nessa onda do conservadorismo e elementos reacionários, o que envolve vários tipos de preconceitos, reações a ressentimentos, fracassos e violências na infância e adolescência, na vida e na escola.
Desajustes familiares, drogas, falta de valorização dos professores e de espaços acolhedores para o aprendizado. Por aí vai.
O GT avalia que o fenômeno é multicausal, reunindo fatores como bullying, que é a perseguição sistemática, problemas mentais não tratados, ou o chamado copycat, delitos que se baseiam ou são inspirados em um crime anterior.
Ou seja, cada crime desses inspira alunos e ex-alunos que têm questões profundas de desajuste social e vivem em uma cultura de ódio. E mais, são cooptados por agentes virtuais que propagam esse ódio nas redes sociais.
Chacinas chocantes
O efeito de onda dos crimes copycat foi observado e medido desde 2002 pelos estudiosos, que levantam a forte relação entre os ataques nos EUA, a exemplo da Columbine High School, em 1999, no Colorado.
Dois estudantes, apenas três semanas antes da formatura, invadiram uma escola suburbana armados com espingardas e armas semiautomáticas, matando 12 alunos e um professor antes de cometerem suicídio. Chocou o mundo todo e lembramos desse fato com pesar. Foram 15 mortes.
Em Santa Catarina, temos pelo menos dois ataques não menos chocantes. Na cidade com o nome de Saudades, no Oeste, em maio de 2021, um criminoso invadiu a Creche Aquarela com uma arma branca.
Invadiu a sala onde as crianças dormiam, e em 11 minutos, assassinou três bebês e duas professoras. Era um jovem de 18 anos inspirado em outros casos, como Columbine.
Em abril de 2023, o cenário de outro ataque foi Blumenau. Quatro crianças mortas e cinco feridas na Creche Cantinho Bom Pastor. Copycats.
Os dados do estudo
Segundo levantamento produzido por membros do GT, o Brasil teve, entre 2002 e o momento de conclusão do relatório, em outubro de 2023, 36 ataques a escolas, vitimando 37 comunidades escolares, resultando em 164 vítimas, sendo 49 casos fatais e 115 pessoas feridas. Dentre os ataques, 16 foram com armas de fogo; 16 com armas brancas; e, quatro, de outros tipos.
Como enfrentar? As ferramentas de controle só funcionam se o aluno tiver letramento suficiente para se interessar por temas mais pacificadores.
E o que temos nas redes? Tem de tudo, precisamos ter capacidade de escolher. Com a cultura armamentista, fica mais difícil. Ontem vi que armas devem ficar mais baratas no Brasil, com redução de impostos. Como fazer com essas políticas criminosas?
Enfim, temos muitas fragilidades na formação crítica, cidadã e humana. Mas cumpre aqui resumir algumas ações sugeridas pelos estudiosos para as políticas públicas.
Vamos lá: promover a cultura de paz; controlar a venda de armas; responsabilizar plataformas digitais com conteúdo extremista; atualizar as leis sobre crimes de ódio; melhorar o ambiente nas escolas; promover políticas de saúde mental nas escolas; expandir ações de socialização, como lazer, cultura, esportes; dialogar com os veículos de comunicação sobre copycats. Enfim, há muitas possibilidades.
Em ano de eleições municipais, vale perguntar aos seus candidatos quais são as políticas públicas relacionadas às escolas em geral, especialmente à segurança e bem-estar das comunidades escolares. Afinal, sempre podemos colaborar e o voto é a nossa melhor oportunidade.