ALESSANDRA CAVALHEIRO – JORNALISTA
A Língua Portuguesa tem 370 mil palavras. Não creio que conseguiria encontrar, entre elas, a descrição do impacto causado pelo incêndio da Boate Kiss, 11 anos atrás.
Tudo reverbera e machuca, principalmente na vida dos entes queridos das vítimas. Nos sobreviventes, as marcas repetem todo o dia o que aconteceu em minutos, poucas horas.
É sempre importante lembrar a dimensão da tragédia: foram 242 vítimas no incêndio de 27 de janeiro de 2013.
Não consigo encontrar no extenso e rico vocabulário uma explicação para essa demora do desfecho jurídico do caso. Muito menos, na infinita sequência dos números naturais, o tamanho dessa tortura. É sim, um massacre para cada um, só de pensar em um novo julgamento.
Obviamente, não me compete julgar, mas tenho os vocábulos como matéria-prima e vasculho nas prateleiras de vogais, consoantes, acentos e símbolos em busca de uma forma de refletir sobre o modus operandi da justiça e seu impacto no coração do coração do Rio Grande.
Porém, posso utilizar as palavras que existem para me solidarizar com essa gente que olha para o horizonte e não sabe mais o que fazer para acalmar tantas dores e as consequências malignas do fato. Posso fazer orações, formular um desejo de que tudo se esclareça, pois a justiça somente será feita quando as vítimas sentirem que, de fato, isso ocorreu.
É algo sutil, a justiça. Posso, quem sabe, ajudar a enviar algum tipo de luz para clarear a mente de quem julga, para que, enfim, sequem as lágrimas.
A demolição do prédio fatídico da rua dos Andradas tem um começo forte e simbólico: a retirada da porta principal, que se fez tão pequena, e do logotipo, com o nome tão falado, repercutindo no mundo inteiro.
Para as vítimas, uma nova etapa. A ressignificação do lugar, as mensagens para que nunca mais aconteça. O memorial vai acolher a arte, as formas, os símbolos, para sempre em nossas vidas.
Será transformado em um lugar de esperança, de transcendência e de uma certa magia, onde corações e memórias se encontram e se transformam na paz infinita com a qual sonhamos.
A destruição dará lugar à beleza e à vontade de melhorar as experiências em todos os sentidos. Que assim seja! E assim será!