Paralelo 29

CASO KISS: Todos os quatro réus já estão presos; o que alegam as defesas

Foto: TJRS

Condenados em júri popular em 2021 se apresentaram depois da decisão do ministro Dias Toffoli, do STF, que validou júri e determinou as prisões

JOSÉ MAURO BATISTA – PARALELO 29

Os quatro réus do processo principal do incêndio da boate Kiss já estão na cadeia. Luciano Bonilha Leão, Marcelo de Jesus dos Santos, Elissandro Callegaro Spohr e Mauro Hoffman se apresentaram ainda na segunda-feira (3), data da decisão do ministro Dias Toffoli, que validou o júri de dezembro de 2021, que havia sido anulado.

Com a validação do júri e das condenações, Toffoli determinou a imediata prisão dos quatro condenados. Bonilha e Marcelo de Jesus, que integravam a banda Gurizada Fandangueira, foram os primeiros a se entregar à Justiça.

Depois, Elissandro Spohr, o Kiko, um dos sócios da boate, se entregou. O último a se entregar foi o outro sócio da boate, Mauro Hoffman, que ainda tentou um habeas corpus, que foi negado pelo desembargador José Luiz John dos Santos, da 3ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJRS).

A decisão do desembargador negando liminarmente o habeas corpus e da noite dessa segunda-feira. Conforme John dos Santos, o mérito do habeas corpus será analisado pela desembargadora relatora do caso no TJRS, Rosane Wanner da Silva Bordasch.

O QUE DIZEM OS ADVOGADOS DE DEFESA

JADER MARQUES, advogado de ELISSANDRO CALLEGARO SPOHR

“Foi com muita surpresa que tomamos conhecimento desta decisão. É uma decisão do ministro Dias Toffoli que julga os dois recursos extraordinários: o primeiro promovido pelo Ministério Público do Rio Grande do Sul, e outro recurso, que foi feito pelo Ministério Público Federal lá no STF (Superior Tribunal de Justiça). Os dois recursos atacavam , o primeiro a decisão do Tribunal de Justiça do RS (TJRS), e o segundo, a decisão do STJ. A surpresa vem do fato de que nós estávamos conversando com a assessoria para marcarmos um horário para conversar com o ministro antes da decisão. E nós esperávamos que pelo menos a defesa pudesse ser ouvida antes dessa manifestação.

O segundo ponto é que a decisão da 1ª Câmara do TJRS, assim como a decisão do STJ, elas tratam de matéria infraconstitucional e nós sabemos que o STF só se manifesta por ataque direto à Constituição. As decisões são imperativas no sentido de que a violação reflexa à Constituição não é matéria do Supremo. Então, isso também causa surpresa à defesa.

Vamos analisar a decisão e ver quais as medidas cabíveis”

BRUNO SELIGMANN DE MENEZES, advogado de MAURO HOFMANN

“Recebemos a informação, mas infelizmente, a decisão tramitou de forma sigilosa às defesas e silenciosa. Tínhamos reunião agendada com a assessoria do Ministro para semana que vem, e fomos tomados de surpresa por uma decisão que ainda não sabemos o teor. Lamentamos que a Suprema Corte dê este exemplo de julgamento antidemocrático, especialmente quando a constitucionalidade do tema está por ser decidida de forma colegiada. De resto, a decisão será cumprida de forma integral e discutida nas esferas competentes.”

DEFESA DE MARCELO DE JESUS DOS SANTOS

“Referente ao processo da Boate Kiss, a defesa de Marcelo de Jesus dos Santos informa que recebeu a notícia da prisão e lamenta que a decisão tenha tramitado de forma sigilosa às defesas, em um movimento silencioso. Tínhamos reunião agendada com a assessoria do Ministro do Superior Tribunal Federal (STF), José Antonio Dias Toffoli, na próxima semana quando, hoje, fomos tomados de surpresa por uma decisão que ainda não sabemos o teor. Lamentamos que o STF dê esse exemplo de julgamento antidemocrático, especialmente quando a constitucionalidade do tema está por ser decidida de forma colegiada. De resto, a decisão será cumprida de forma integral e discutida nas esferas competentes.”

JEAN SEVERO E MARCIO AUGUSTO PAIXÃO, advogados de LUCIANO BONILHA

“A defesa de Luciano Bonilha discorda da decisão proferida hoje pelo Min. Dias Toffoli, pois entende que os recursos processuais interpostos pela acusação não expressam afronta direta a dispositivo da Constituição Federal, mas sim matéria infraconstitucional. Não há, também, repercussão geral demonstrada, o que deveria impedir a tramitação desses recursos. Ademais, os acusados não poderiam ser presos imediatamente em decorrência desses recursos, porque já possuem em seu favor uma ordem de habeas corpus (nº. 0062632-23.2021.8.21.7000), já transitada em julgado, que lhes garante ficarem em liberdade. A defesa tomará todas as medidas cabíveis para que essa decisão seja revertida.

“Todas as defesas foram pegas de surpresa com essa decisão. Vamos ainda analisar os próximos passos, no que tange a recursos. Estamos muito tristes com a prisão do Luciano. O Luciano foi absolvido moralmente e infelizmente, neste momento, volta ao cárcere de forma injusta. Então vamos ter serenidade e tomar as medidas judiciais cabíveis no tempo mais rápido possível.

ONDE ESTÃO OS PRESOS

LUCIANO BONILHA LEÃO, auxiliar da banda Gurizada Fandagueira, se apresentou à Polícia Civil em Santa Maria e foi encaminhado à Penitenciária Estadual de Santa Maria (Pesm). Bonilha foi condenado a 18 anos de prisão por homicídio simples com dolo eventual.

MARCELO DE JESUS DOS SANTOS, vocalista da banda Gurizada Fandangueira, foi recolhido ao Presídio Estadual de São Vicente do Sul. Marcelo foi condenado a 18 anos de prisão por homicídio simples com dolo eventual.

ELISSANDRO CALLEGARO SPOHR, o Kiko, sócio da boate Kiss, se apresentou à Polícia Civil em Porto Alegre. Em princípio, foi recolhido a um presídio de Canoas. Na manhã desta terça-feira (3), na audiêcia de custódia, seria definido onde ele cumprirá a pena. Kiko foi condenado a 22 anos e seis meses de prisão por homicídio simples com dolo eventual.

MAURO LONDERO HOFFMAN, sócio da boate Kiss, se apresentou à Polícia Civil em Canoas e aguardava encamihameto para um estabelecimento prisional. Mauro foi condenado a 19 anos e seis meses de prisão por homicídio simples com dolo evetual.

UMA TRAGÉDIA QUE MARCOU SANTA MARIA

Homenagens às vítimas da Kiss logo após a tragédia de janeiro de 2013/Foto: Fernando Frazão, Agência Brasil

A tragédia da boate Kiss, na madrugada de 27 de janeiro de 2013, deixou 242 mortos e 636 feridos. O incêndio começou quando o vocalista da Gurizada Fandangueira Marcelo e Jesus dos Santos acionou um artefato pirotécnico durante show da banda em uma festa universitária.

A boate estava lotada, e a faísca do artefato atingiu o teto da boate revestido de uma espuma tóxica. A fumaça inalada pelas pessoas foi apontada pela Polícia Civil como a causa da maioria das mortes. Houve também vítimas de queimaduras e pisoteamentos durante a tentativa de fuga.

Em janeiro deste ano, o podcast Estação 29 conversou com o presidente da Associação da Associação dos Familiares de Vítimas e Sobreviventes da Tragédia de Santa Maria (AVTSM), Gabriel Rovadoschi Barros. O jovem é um dos sobreviventes da tragédia e comentou a exaustiva luta das famílias por justiça.

UM INQUÉRITO RUMOROSO

O inquérito rumoroso ficou sob a responsabilidade do delegado Marcelo Mendes Arigony. Na conclusão, ele apontou, também, autoridades municipais como responsáveis pela tragédia devido à falta de fiscalização da casa noturna.

Entre os apontados estava o prefeito de Santa Maria à época, Cezar Schirmer (PMDB). No entanto, o Ministério Público entendeu que não havia elementos para a responsabilização de autoridades apontadas, e pediu o arquivamento.

O Tribunal de Justiça do RS acolheu a posição do MPRS e arquivou o caso em relação a esses apontamentos. Em participação no podcast Estação 29, no ano passado, Arigony falou sobre sua atuação na tragédia da Kiss.

Outro delegado que participou das investigações, Sandro Luiz Meinerz, também falou sobre o inquérito no Estação 29.

PROCESSO LONGO E BATALHAS JURÍDICAS

Em nível local, o processo da Kiss foi instruído pelo juiz Ulysses Fonseca Louzada. Na época, houve uma batalha jurídica para decidir se o júri seria realizado em Santa Maria ou em outra cidade. Acabou prevalecendo a decisão de transferir o júri para Porto Alegre. Também no podcast Estação 29, Ulysses Louzada falou sobre o processo da Kiss.

Depois de quase 10 anos de espera, o júri dos quatros réus do processo principal foi realizado em Porto Alegre. Todos foram condenados. No entanto, recorreram e em agosto de 2022, o TJRS anulou o julgamento. Nova batalha jurídica nos tribunais.

Em setembro do ano passado, o Superior Tribunal de Justiça (STF) decidiu manter a decisão do TJRS. Ou seja, confirmou a anulação do júri de 2021, determinando que se marcasse um novo júri.

Um novo júri chegou a ser marcado para 26 de fevereiro deste ano. No entanto, o mesmo ministro Dias Toffoli suspendeu o novo júri até que fosse julgado, naquela corte, o recurso do MPRS contra a anulação do julgamento anterior.

(Com informações do STF, da Agência Brasil, do STJ, do MPRS e do TJRS)

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