Paralelo 29

SILNEI SCHARTEN SOARES Games, mídia e Saudades (Parte IV – final)

SILNEI SCHARTEN SOARES

Doutor em Comunicação e especialista em cinema

O que games nos revelam sobre nós mesmos (e o que a cobertura da mídia sobre o caso da chacina em uma creche em Saudades – SC, cometida por Fabiano Kipper Mai, tem a ver com isso)

Não quero encerrar sem antes deixar aqui uma citação de Steven Johnson. Diz ele que os games propiciam “o surgimento de formas que encorajam pensamento e análise participativos, formas que estimulam a mente a dar sentido aos ambientes”.

E, logo a seguir: “o que de fato se faz quando se joga videogame – a maneira como a mente tem de funcionar – (…) é encontrar ordem e significado no mundo e tomar decisões que ajudem a criar essa ordem”.

SILNEI SCHARTEN SOARES: Games, mídia e Saudades (Parte III)


Games ajudam a criar ordem no mundo e dar significado a ele. Quem sabe era isso que Fabiano buscava enquanto “passava muito tempo no quarto jogando games violentos”.

Talvez o jogo o ajudasse a entender o mundo em que vivia e o que a vida tinha para lhe oferecer.

Brasil Game Schow/Foto: Rovena Rosa, Agência Brasil

Os games podem ter auxiliado Fabiano a compreender que o bullying que sofria na escola abriram uma ferida que não cicatrizava.

Sabemos, pelas reportagens sobre o caso, que Fabiano optou pela creche por julgá-la mais fácil de ser invadida, mas seu alvo original era a escola onde havia estudado.

Por que o alvo de Fabiano era a escola? O bullying é parte da resposta, certamente. E o que mais?

SILNEI SCHARTEN SOARES: Games, mídia e Saudades (II)


Podemos buscar respostas para as motivações de Fabiano fazendo esse tipo de pergunta, em vez de afirmar levianamente que os jogos foram os responsáveis pelo massacre.

Com raras exceções, a mídia se torna caixa de ressonância dos preconceitos e da ignorância da sociedade. Onde e quando perdeu sua vocação iluminista?

Por que a mídia não muda as perguntas? Por que não questiona se Saudades não tinha mais nada a ofertar pro Fabiano a não ser o emprego numa fábrica local, onde ele passava o dia bordando confecções?

Sabemos o quanto esse trabalho é repetitivo e extenuante. Que recompensas o trabalho de Fabiano tinha para lhe oferecer?

SILNEI SCHARTEN SOARES: Games, mídia e Saudades (I)

Havia alguma expectativa de crescimento profissional? Ou alguma gratificação pela qual valeria a pena esperar? Provavelmente, nada além de fazer tudo sempre igual. Todo dia.


O turno de Fabiano começava às 5 horas da manhã. Não surpreende que ele passasse várias horas jogando. Com certeza, os games lhe proporcionavam uma experiência bem mais atraente do que a vida ordinária que levava.

Talvez jogar fosse uma válvula de escape de uma realidade cruel demais para ser suportada a seco.

Foto ilustrativa/Marcello Casal Jr/Agência Brasil

Especialista em cinema passa a colaborar no Paralelo 29

Se Fabiano invadiu uma creche e matou 5 pessoas, ouso afirmar que isso aconteceu apesar de ele ser um gamer, e não por causa disso. Os games não foram a causa desse ato violento.

As razões devem ser buscadas em outro lugar. Alguma coisa bugou na vida de Fabiano. Talvez, o bug também seja nosso. Falhamos como sociedade.
Nós, ao menos, podemos seguir no jogo da vida. Para Fabiano e suas vítimas, o jogo acabou.

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