BRUNA OSÓRIO PIZARRO – Psicóloga e psicanalista
“Ter filho é um fato da existência que nos concerne a todos, porque mesmo que optemos por não tê-los somos, forçosamente, filhos de alguém. Algumas pessoas dirão que passaram a vida pensando em ter filhos e nunca se imaginaram sem ser pai e mãe. Outros dirão que jamais se imaginaram pais e mães e, ainda assim, tiveram filhos. Mais recentemente temos as pessoas assumindo que preferem não tê-los, sem que isso cause grande assombro à sua volta. Fica impossível determinar de antemão quais pessoas se tornarão satisfeitas com o acontecimento e quais se arrependerão.” Estes são trechos do livro Criar filhos no século XXI da Vera Iaconelli, mas poderiam ser sobre narrativas que chegam até a clínica.
Dizem que a maternidade é um caminho sem volta. A partir de determinada visão, é mesmo. De um outro ponto de vista, e se fizéssemos uma discussão sobre direitos sexuais e reprodutivos, poderíamos ampliar essas afirmações.
A questão é que muitas mulheres não têm a escolha de se demitir do papel e função de mãe, assim como os homens que são chamados de pai são autorizados.
O pai se demitiu! Quando escolheu que não queria estar presente. Quando chegou em casa e se sentou no sofá vendo a vida acontecer. Quando não deu banho. Quando não fez a janta. Quando não viu as “primeiras vezes”. Quando não acordou durante a noite. Quando nunca levou e/ou pegou na escola. Quando pôde brincar junto e disse que não estava com vontade. Etc. Etc. Etc.
Ser mãe e ser pai vai além de estar com vontade. Levanta a mão, a mulher mãe, que sempre teve vontade de ir no parquinho no dia lindo de sol!
Homens pais! Existe uma FUNÇÃO além de um PAPEL em ser pai!
O papel, muitos fazem bem, pois diz respeito, justamente, aos costumes do que é esperado desse homem pai. E vamos combinar que esse caminho ainda percorre uma linha direta com o dinheiro, o “prover financeiro”. Estes, se enchem de orgulho em pagar a pensão (em dia, eles dizem), “não deixar faltar nada” ou fazer uma boa poupança no banco destinada ao/a filho/a. É claro, falo de um grupo privilegiado ($ e raça), mas que existe.
A função diz respeito ao que é imprescindível para que uma criança se desenvolva da melhor maneira possível. Fala sobre o que é transmitido sendo. Se refere ao laço. A função implica assumir responsabilidades ao longo do desenvolvimento dos/as filhos/as.
É preciso coragem, papais! Algo que a mulherada que se torna mãe, já está acostumada a acessar, simplesmente, por ser mulher.
Muitas são as famílias marcadas por um pai que está e não está. Estes homens estão agarrados nas suas certezas de como fazer, ou não fazer, e preferem não se moverem. Seguem no concreto que a “falta é dinheiro” e se enquadram dentro deste espaço bem pequeno, como se fôssemos constituídos apenas pelo que vemos.
Eu acredito que vocês podem mais, pois muitas são as famílias marcadas pela ausência de um pai que está presente. Uma presença sem espaço para uma função. Um pai que se demitiu!
“Quem dera
Pudesse todo homem compreender a mãe
Quem dera ser o verão o apogeu da primavera
E só por ela ser”
Super-homem (A canção) – Gilberto Gil