Paralelo 29

Lei obriga mulher a ver imagem de feto antes de aborto legal em Maceió

Foto: Fábio Rodrigues Pozzebom, Agência Brasil

Com informações de Letycia Bond – Repórter da Agência Brasil – São Paulo

Em Santa Maria, vereadores aprovaram projeto prevendo que médicos aconselhem grávidas de estupradores ouvirem batimentos cardíacos do nascituro

A Câmara de Vereadores de Maceió (AL) aprovou uma lei que faz com que mulheres que optem por realizar aborto legal na rede pública do município tenham que assistir vídeos e visualizar imagens com fetos. A lei de Maceió é mais agressiva que a proposta aprovada pela Câmara de Vereadores de Santa Maria e que foi vetada pelo prefeito Jorge Pozzobom (PSDB).

No caso de Maceió, a Lei 7.492, que entrou em vigor esta semana, prevê que, durante encontros com gestantes e familiares, uma equipe multidisciplinar deverá apresentar os possíveis efeitos colaterais físicos e psíquicos decorrentes do procedimento, como “pesadelos”, “depressão” e “remorso” relacionados à decisão. A lei foi publicada no Diário Oficial do município na última quarta-feira (20).

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Autoria é de um vereador do PL

Proposto pelo vereador Leonardo Dias (PL), o texto foi promulgado pela Câmara Municipal de Maceió. Pela nova lei, as equipes de saúde também poderão abordar, nas conversas com as mulheres, a opção de levarem adiante a gravidez e deixarem as crianças para a adoção.

Atualmente, a lei no Brasil permite o aborto em três situações: quando a gravidez resulta de um estupro, quando a gestação representa um risco à vida da mulher e nos casos em que o feto tem anencefalia.

A descriminalização do aborto de anencéfalos (com deformação do cérebro e sem a calota craniana) ocorreu somente em 2012, por decisão do Supremo Tribunal Federal (STF).

Apesar de o aborto já ter sido legalizado nas três situações, há vários casos de autoridades da Justiça que procuram impedir mulheres de executá-lo.

Foi o que se verificou em um caso envolvendo uma adolescente de 11 anos e magistrados do Piauí. A menina foi vítima de estupro e engravidou pela segunda vez.

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Contestação

Em sua conta na rede social X (antigo Twitter), a deputada federal Erika Hilton (PSOL-SP) classificou a medida de “inaceitável” e “um ataque encabeçado por fundamentalistas e a extrema direita”.

Para ela, a Câmara Municipal de Maceió tem o objetivo de “constranger” as mulheres que têm direito ao aborto legal. A postagem foi feita na quinta-feira (21).

“São pessoas, muitas vezes, em sofrimento, passando por uma nova revitimização por parte do Poder Público. Isso é inaceitável, é negação do acesso a direitos, é tortura psicológica, é constrangimento ilegal e precisa ser combatido, na política, e na Justiça”, escreveu a parlamentar, que é vice-presidenta da Comissão de Direitos Humanos, Minorias e Igualdade Racial, na Câmara dos Deputados.

Erika Hilton informou, também pela rede social, que acionou o Ministério Público Federal para tentar assegurar que as mulheres tenham respeitado o seu direito ao aborto legal. A deputada acrescentou que as autoridades de Maceió deveriam focar sua atenção, no momento, nas calamidades que atingem a população do município, referindo-se ao caso da Braskem.

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Pesquisa no Brasil

De acordo com a pesquisa Nascer no Brasil, de âmbito nacional, feita por especialistas da Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca, da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), aproximadamente 55% das brasileiras que tiveram filhos não desejavam engravidar.

Os pesquisadores ouviram mais de 23 mil mulheres de todo o país, entre 2011 e 2012, e identificam também dificuldades de acesso a exames fundamentais para as gestantes, como os de pré-natal, em diversas localidades.

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Menos julgamento da sociedade

O Centro Feminista de Estudos e Assessoria (Cfemea) é uma das entidades que perceberam que afastar o moralismo da pergunta em torno do aborto revela uma sociedade brasileira menos conservadora em relação ao aborto do que se imagina.

É isso que demonstra uma pesquisa que realizou em parceria com o Observatório de Sexualidade e Política (SPW, na sigla em inglês, que se refere a Sexuality Policy Watch) e o Centro de Estudos de Opinião Pública (Cesop), da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp).

O que se descobriu é que, entre 2018 e 2023, aumentou a quantidade de brasileiros e brasileiras que são contra a punição das mulheres que optam por fazer um aborto.

Em 2018, 51,8% dos entrevistados eram contra a prisão de mulheres que abortavam, proporção que subiu para 59,3% em 2023.

A mudança de mentalidade vem acontecendo tanto entre homens quanto entre mulheres e também independentemente da idade, sendo que jovens na faixa etária de 16 a 18 anos se posicionaram mais firmemente contra a prisão, em uma pesquisa de 2021.

Como destacam as organizações responsáveis pela análise, perguntar se uma mulher deve ir para a prisão por ter interrompido uma gravidez é diferente de questionar se alguém é contra ou a favor da descriminalização do aborto.

Isso porque o modo de se indagar faz com que o entrevistado ou a entrevistada tenha mais empatia e se coloque no lugar da mulher que não queria ter um filho naquele momento, inclusive por reconhecer que não tem como sustentar a criança adequadamente.

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Projeto semelhante em Santa Maria

Em agosto deste ano, a vereadora Roberta Leita (PP) apresentou um projeto de lei que, na prática, obrigava os médicos a aconselharem que grávidas de abusadores a ouvirem os batimentos cardíacos do nascituro. O texto original previa, inclusive, multas para os médicos que não aconselhassem as gestantes, embora a redação não obrigasse as mulheres a acatar a sugestão.

O vereador Tubias Calil (MDB) apresentou uma emenda amenizando o texto. Em vez de obriga os médicos, sugere que eles aconselhem as gestantes a ouvirem o coração do feto. O projeto foi aprovado com 12 votos contra seis em uma sessão tumultuada, na madrugada do último dia 13.

A pressão de mulheres, entidades, coletivos, influenciadores e de partidos de esquerda teve repercussão nas redes sociais, e o prefeito Jorge Pozzobom (PSDB) vetou o texto aprovado, assim como outro projeto da mesma vereadora, também aprovado, que determinava a afixação de cartazes com informações e ilustrações sobre métodos de aborto e a destinação do feto depois do procedimento.

Agora, a Câmara de Santa Maria deverá analisar os vetos do prefeito assim que retornar do recesso parlamentar, em fevereiro do próximo ano. A pressão continua, e, até agora, dois vereadores que votaram favoravelmente já anunciaram que votarão pela manutenção dos vetos.

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Defesa do projeto e pressão contra

A vereadora autora dos projetos tem usados as redes sociais para afirmar que seu projeto não cria nenhuma obrigação para as mulheres grávidas, mas, sim, estende a elas um direito, que é a prioridade de acesso aos serviços de saúde na rede pública, como o acesso à ultrassonografia. Só que é a partir desse direito que o projeto prevê que os médicos possam sugerir a escuta dos batimentos cardíacos.

Na última quinta-feira (21), durante a eleição da nova Mesa Diretora da Câmara, manifestantes levaram cartazes contra os projetos de lei vetados pelo prefeito. Eles entregaram uma carta ao novo presidente da Câmara, Manoel Badek (União Brasil), Maneco, com argumentos favoráveis à manutenção dos vetos.

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