Advogados de comunidades afetadas e Prefeitura pedem que Justiça esclareça pontos contraditórios da determinação; MP discorda
JOSÉ MAURO BATISTA – PARALELO 29
O Município de Santa Maria e advogados de moradores de três áreas de risco nos arredores do Morro do Cechella recorreram da decisão da Justiça, que determinou a retirada imediata de pessoas que vivem nas áreas. Eles alegam que o pedido do Ministério Público e a decisão judicial são confusos, com contradições.
O Ministério Público já apresentou suas alegações e pediu que a Justiça não acolha os recuros. As contrarrazões foram apresentadas pelo promotor plantonista Diego Corrêa de Barros.
Em Embargos de Declração, a Prefeitura de Santa Maria alega que precisa saber exatamente a extensão da ordem judicial, que não estaria clara.
“Há obscuridade e contradição na decisão, tendo em vista que não restam claros os prazos para cumprimento de obrigações pelo Município, haja vista que imediatamente não se coaduna com diálogo, conscientização e persuação racional”, diz o recurso assinado pelo procurador-geral do Município, Guilherme Cortez, e pela procuradora Mirela Marques.
Canário quer a religação da luz
Enquanto a situação não se resolve, a maioria dos moradores permanece nos locais. No caso da Rua Canário, o líder comunitário Marcone Filipini, diz que as famílias que ficaram estão sem energia elétrica e sem recolhimento de lixo. Ele disse que nesta segunda-feira (12), haverá uma nova reunião para tratar da religação da luz.
O advogado Thiago Carrão Sturmer, que representa um dos moradores na ação judicial, disse que estuda entrar com um pedido judicial de religação da energia elétrica. Ele disse que aguardará uma nova reunião com a Prefeitura. Na sexta-feira, o prefeito Jorge Pozzobom (PSDB) que só religará a energia das casas se houve uma decisão judicial mandando a Prefeitura a religar.
Comunidade quer investigar intervenção no Morro
Marcone afirmou ao Paralelo 29 que a comunidade “está tranquila” quando aos alertas de deslizamentos e insiste que o local não oferece riscos. As mortes, segundo ele, teriam ocorrido devido a um deslizamento provocado por valetas que teriam sido abertas tempos antes.
Advogados que representam os moradores querem que seja investigada essa intervenção humana no Morro do Cechella e que, segundo a comunidade da Canário, poderá ter provocado o deslizamento de 1º maio.
No entanto, a Defesa Civil interditou a área com base em estudos da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), que apontam rachaduras no morro provocadas que não teriam sido provocadas pelas valetas, como alegam moradores.
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Paralelo 29 acompanhou ações
No sábado (11), o Paralelo 29 acompanhou a tentativa da Prefeitura de retirar moradores da Canário. Após muita negociação, apenas 11 pessoas saíram de casa e foram para um abrigo.
Dias antes, na terça-feira (7), o Paralelo acompanhou a Defesa Civil na Canário, onde houve interdição de partes da via, e na Churupa, onde não chegou a ocorrer a ação.
Nas duas ocasiões, houve muita tensão e resistência de moradores locais a deixarem suas casas. Eles alegam, sobretudo, incertezas sobre seu futuro.
O QUE PEDIU O MINISTÉRIO PÚBLICO
Principal pedido na ação civil pública ajuizada
- Retirada imediata de moradores das Vilas Canário (Rua Canário), Nossa Senhora Aparecida (Churupa) e Bürguer, todas nas encostas do Morro do Cechella, no Bairro Itararé
- A alegação é o risco de novos deslizamentos no Morro do Cechella, tendo em vista já ter ocorrido duas mortes (mãe e filha) na Rua Canário, na tarde de 1º de maio
O QUE DETERMINA A JUSTIÇA
Decisão do juiz Diego Teixeira Delabary em pedido do Ministério Público:
- Ações imediatas de busca e salvamento das pessoas e animais que se encontrem em risco de vida, preferencialmente através do diálogo, conscientização e persuasão racional, inclusive mediante remoção compulsória, podendo utilizar da força policial quando necessário
- Garantia da dignidade dos moradores retirados de suas casas, acompanhados de sua família, bem como atendimento de saúde quando do cumprimento
- Indicação e garantia de local para acolhimento de pessoas e animais a serem desalojados
- Disponibilização e transporte para pessoas e animais de áreas de risco
- Amparo aos evacuados em acolhimento temporário para assistência à população em situação de desastre, em condições adequadas de higiene e segurança
O QUE ALEGA A PREFEITURA
EMBARGOS DE DECLARAÇÃO – PARA ESCLARECIMENTOS – Assinado pelo procurador-geral do Município, Guilherme Cortez, e pela procuradora Mirela Marques
- Obscuridade e contradição na decisão, que não deixa claros os prazos para cumprimento da obrigação de retirar os moradores
- Questiona a negativa de marcação de audiência de conciliação e a determinação da imediata retirada dos moradores, o que contradiz a parte da decisão que fala em diálogo
- Afirma que todos os pedidos do MP já estão sendo atendidos pela Prefeitura, como as ações para retirada de pessoas, abrigos para quem deixar as casas, aluguel social e toda a assistência e segurança necessárias
- A Prefeitura também destinou local para acolhimento dos animais de estimação
- A Prefeitura também garantiu transporte para as pessoas saírem de suas casas
- A Prefeitura ainda destaca reuniões com moradores, ações anteriores de evacuação de áreas de risco e os constantes alertas para as pessoas deixarem regiões perigosas
- A Prefeitura sugere que a determinação deveria ser dirigida diretamente aos moradores
QUEM SE HABILITOU NA AÇÃO CIVIL PÚBLICA
Representantes dos moradores e seus advogados:
- Juliano Gilmar Peres Marinho, morador que tem como advogados Pedro Gonçalves Barcellos Júnior e Márcia Souza Santos
- José Francisco Silva, representante da União das Associações Comunitárias (UAC), que tem como advogados Eloi Tarouco Irigaray e Sandro Cortes Raymundo
- Comissão Provisória da União das Associações Comunitárias (UAC), que tem como advogados Eloi Tarouro Irigaray e Sandro Cortes Raymundo
- Helen Martins Cabral, vereadora do PT (habilitada como pessoa física), que tem como advogado Fabio Fleck Borba
- Lidiane de Oliveira Machado Priebe, moradora que tem como advogados Thiago Carrão Sturmer, Marcelo Furlan e Renata Quartiero
O QUE ALEGAM OS MORADORES
O Paralelo 29 teve acesso a informações por meio de um dos advogados (Thiago Carrão Sturmer) e de um dos líderes comunitários (Marcone Filipini, um dos representados por Pedro Barcellos Júnior):
- Os moradores alegam que há contradições no pedido do Ministério Público e na decisão judicial e pedem que esses pontos sejam esclarecidos
- Querem saber se após a passagem dos eventos climáticos e do perigo iminente os moradores que saírem poderão retornar às suas casas
- Também está em estudo uma ação judicial para a religação da energia elétrica, que está desligada desde 1º de maio, quando houve deslizamento com duas mortes na Canário
O QUE DIZ O MP SOBRE OS RECURSOS
Contrarrazões do MP aos Embargos Declaratórios
- O pedido do Ministério Público e a decisão judicial de retirada imediata não são obscuros nem contraditórios, uma vez que a remoção se embasa em indicativos de possibilidade de novos deslizamentos devido ao excesso de chuvas (alertas de riscos geoóligicos e hidrológicos)
- O MP discorda dos dois pedidos dos moradores, entre eles o retorno dos moradores às áreas de risco. No entedimento do MP, “qualquer retorno está condicionado exclusivamente à inexistência de risco de morte, questões geológicas e a interdição existente, e não à situação climática